A America’s Cup é considerada a mais antiga prova internacional de esporte do mundo, remontando ao ano de 1851. Ao longo das décadas, seguidos avanços tecnológicos foram aplicados aos barcos participantes da competição, considerada hoje a Fórmula 1 dos mares. Mas, nenhuma inovação foi tão radical e determinante quanto a introdução, na edição de 2013, de uma poderosa “arma”.
Aproveitando uma brecha no regulamento, os neozelandeses trouxeram o catamarã Aotearoa, o primeiro barco da America’s Cup a utilizar hidrofólios, recurso que desde o final do século 19 já era conhecido no mundo da náutica. Hidrofólios são asas que ficam submersas sob os cascos do barco e que projetam o mesmo para cima. Quando o catamarã está “voando”, os cascos perdem contato com a água e o arrasto é muito menor – consequentemente, a velocidade aumenta muito. A partir da série de regatas realizadas naquele ano na baía de São Francisco, a America’s Cup mudou para sempre.
“Na prova de 2017, nosso objetivo é estar voando durante 100% do tempo das regatas”. A frase de Ian ‘Fresh’ Burns, engenheiro da equipe Oracle Team USA, dita em uma coletiva de imprensa realizada na véspera da apresentação do novo barco da equipe, em Bermudas, na semana passada, pode soar estranha para um membro de um time de corrida náutica. E se a equipe que mais permanece no ar leva vantagem, estabelecer parcerias com empresas que dominem este elemento parece fundamental. Não à toa, desde 2014 a equipe Oracle Team USA mantêm um acordo de troca de tecnologia com a francesa Airbus.
O líder de desenvolvimento de negócios Pierre-Marie Belleau e uma equipe de mais de trinta engenheiros (dois em regime de dedicação integral, alocados no base do time americano em Bermudas) oferecem o que há de mais avançado em engenharia aeronáutica ao time americano: desde testes em simuladores na própria Airbus ao desenvolvimento de sistemas hidráulicos e de controle, passando por know-how em aerodinâmica, estrutura, materiais compostos, tecnologias de impressão 3D e processamento de dados.
“Hoje, a similaridade entre aviões e barcos da America’s Cup é evidente: a vela rígida do AC 50 (mais abaixo, um desenho do antecessor, o AC 45F) lembra muito a asa de um Airbus 320 enquanto que o hidrofólio pode ser comparado a um sharklet, a extremidade torcida desta parte do avião”, explicou Belleau, durante o evento.
Mas os benefícios da parceria que poderia fluir como uma via de apenas uma mão, também impactaram positivamente os projetos da fabricante de aviões. “O processo de fabricação dos novos sharklets da família Airbus 320, por exemplo, herdará parte da tecnologia desenvolvida para a produção do hidrofólio do barco AC 50. Também vamos incorporar no avião A350 XWB o que aprendemos sobre os sensores MEMS (micro-electro-mechanical systems ou sistemas micro-eletro-mecânicos) depois de termos criado uma versão específica dos mesmos para aferir dados precisos sobre a asa do barco, com o objetivo de otimizar o seu desempenho.”, afirmou o engenheiro francês.
“O Oracle Team USA é uma equipe pequena, como uma startup. O objetivo deles é chegar o mais próximo do limite, correndo todos os riscos. Já uma empresa grande como a Airbus precisa pensar em segurança para seus produtos. São metas diferentes, mas o resultado destas trocas de experiências e “mindsets” acaba sendo interessante para os dois lados”, avalia Belleau.
A 35ª edição da America’s Cup acontecerá nas Ilhas Bermudas com uma série de regatas que serão realizadas entre os dias 25 de maio e 27 de junho deste ano. Que seja tão emocionante quanto em 2013, quando o Oracle Team Usa conseguiu aquela que é considerada uma das maiores, se não a maior, reviravolta de todos os tempos em uma competição. O time neozelândes estava ganhando por 8 a 1 é só precisava vencer a regata seguinte para sagrar-se campeão. Mas, liderados pelo capitão Jimmy Spithill, os americanos conseguiram virar o “jogo” para 9-8, conquistando, assim, o bicampeonato.